Por Maicon Melito de Souza*
Aos caros leitores, desculpem-me o trocadilho do título, mas ele representa bem o que vos direi.
Tenho notado que o direito parece estar na boca do povo, mais do que nunca. Para uns, por conta de maior exposição midiática do sistema de justiça, para outros, por conta de maior engajamento cívico.
Quanto ao direito tributário, venho experienciando alguns casos pitorescos, nem sempre no campo acadêmico ou judicial e extrajudicial, também em atos e fatos costumeiramente triviais do dia a dia. Esses acontecimentos aparentemente indicam a popularização do direito.
Meses atrás, contratei um serviço de táxi — contratei um carro de aluguel, diria minha bisavó, de semblante civilista — em um importante centro econômico do País. Durante o trajeto, o motorista puxou assunto falando de seus trabalhos prestados aos turistas e perguntando a mim se eu era advogado, provavelmente deduzindo com base no destino da corrida. Respondi que sim, acrescentando singelamente as minhas áreas de atuação. A partir disso, ele foi tecendo seus comentários de direito financeiro e tributário, os quais sintetizarei aqui.
De início, ele arrazoou em defesa dos então projetos legislativos de redução das alíquotas dos ICMS(s) — conhecendo dos fatos, considerei sua intenção de “reduzir os outros impostos” (sic): PIS/Pasep, Cofins, Cide-combustíveis — incidentes sobre operações com alguns combustíveis. Porém, desconsiderou o impacto fiscal nos Estados-membros, que trocava arrecadação por abatimento de dívidas para com a União — muitas questionadas judicialmente.
Por amor ao debate — muitas das vezes sem amor, é verdade —, tentei contestar de forma mais coloquial, argumentando que provavelmente as pessoas pagariam um pouco menos pelo combustível; no aspecto macroeconômico, que talvez existiria alguma deflação significativa dos principais índices ou que eventualmente haveria algum estímulo relevante para o crescimento do PIB; o certo era que os serviços públicos prestados ou colocados à disposição à grande parte das pessoas seriam severamente afetados por falta de recursos. A título de curiosidade — ainda que possivelmente com ou sem nexo de causalidade —, embora entes federados tivessem reduzido as alíquotas dos referidos tributos há semanas daquela conversa, paguei naquela corrida de táxi mais do que o dobro do que pagaria a um serviço de aplicativo semelhante.
O motorista impugnou meus argumentos com sua premissa de falta de sentimento patriótico dos governadores estaduais, o que é curioso, na medida que desconsiderou o federalismo fiscal com base no patriotismo.
Depois, tentou fazer uma consulta ali mesmo — suponho que era sua intenção desde o início. Jogando o verde para colher o maduro, apresentou a mim seus entendimentos sobre a isenção automática de IPVA concedida por seu outro carro com mais de vinte anos de fabricação e fez vários questionamentos acerca da hipótese de dispensa de pagamento desse tipo de imposto por conta da penhora de sua motocicleta em uma ação de execução de alimentos, até mencionou que tinha participado de uma “motociata” (sic) em homenagem ao então presidente da República — também por questão de estilo, uso letra inicial maiúscula ou minúscula em determinados substantivos.
No final da corrida, paguei o serviço, ele deu seu cartão e ofereceu seus serviços rindo, falando em língua inglesa algo que entendi como o seguinte trocadilho: “Tax and taxi” (naquele contexto, em tradução livre para o português, algo como: “imposto e táxi” ou “tributário e táxi”).
Moral da história? São diversos os indícios de que o direito tem se disseminado entre as ditas “pessoas do povo”, entretanto, não necessariamente com devida compreensão. Questão de opinião? Talvez aquele taxista diga que é questão de interpretação e integração da legislação tributária.
Palavras-chave: combustíveis; crônica; tax; taxi; tributário.
* Advogado, pesquisador, escritor… Especializando em direito tributário pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP/USP), com bolsa da USP e da Fundação para o Desenvolvimento do Ensino e da Pesquisa do Direito (FADEP). Bacharel em direito pela Faculdade de Direito de Franca (FDF).