Esta Casa adotaria o sistema distrital no Brasil

Escrito por Francielle Araújo Pains [*]

Nesta série, apresentamos debates no modelo do parlamento britânico, dos quais participamos na Hermenêutica – Sociedade de Debates da UnB. Nesse formato, há duas duplas de Governo, que devem apresentar argumentos para apoiar a moção (extinguir o fundo eleitoral), e duas duplas de Oposição, que argumentam em sentido contrário. Aqui, apresentamos as teses e os argumentos de cada lado.

Antes de partirmos à argumentação propriamente dita, é necessário estabelecermos os termos do debate.

Primeiramente, trata-se de uma moção de policy. Nesse tipo de moção, os competidores debatem a adoção de uma política pública, devendo caracterizar seu funcionamento e apresentar seus prós e contras. Como Esta Casa (EC) é representada pelo governo, é deste o dever de defender a adoção da política em questão.

Nesse sentido, para o presente debate, as casas de Governo devem apresentar argumentos favoráveis à adoção do sistema distrital no Brasil, enquanto as casas de oposição devem apresentar-se contrários a esse sistema. Após essa primeira definição, é importante caracterizarmos o que é o sistema distrital.

Trata-se um sistema de votação no qual o país é dividido geograficamente em distritos de equivalente população. Cabe a cada um destes distritos eleger um candidato, o qual só poderá concorrer em um único distrito e será eleito por maioria simples. De maneira oposta, no sistema proporcional, atualmente utilizado no Brasil, os eleitores votam em candidatos que disputam em todo o território de seu estado, sendo eleitos com base na representação proporcional de seu partido no total de votos do estado, por meio dos quocientes eleitoral e partidário.

O quociente eleitoral estabelece o número mínimo de votos que um partido deve ter para eleger candidatos. Ele é calculado dividindo a soma dos votos válidos de uma região pelo número de cadeiras em disputa. Apenas os partidos que atingirem o quociente poderão eleger deputados, sendo a quantidade de vagas do partido definidas pelo quociente partidário.

Com isso em mente, podemos passar aos argumentos de cada lado do debate.

De início, um possível argumento para casas de Governo diz respeito à representatividade territorial. Uma vez que, no sistema distrital, os candidatos só concorrem dentro do distrito, eles estarão, consequentemente, mais próximos dos eleitores. Essa proximidade entre eleitor e candidato se desdobra em dois efeitos.

O primeiro efeito é uma maior preocupação do parlamentar em defender as causas de seu distrito. Visto que o voto nesse sistema é nominal e majoritário, a fiscalização do candidato eleito é muito maior. Isso porque os eleitores sabem exatamente em quem estão votando e irão cobrar o avanço das pautas de seu interesse. Além disso, por ser representante de um distrito, as pautas desses parlamentares terão um caráter mais local, possibilitando a discussão de pautas de regiões menos favorecidas que ficam invisibilizadas no sistema atual.

Sob esse viés, o segundo efeito é o maior engajamento eleitoral da população, que, por ter maior contato com os candidatos e o ônus do voto majoritário, demonstraria maior interesse no processo eleitoral.

Uma deficiência nesse argumento, entretanto, consiste no fato de que ele desconsidera as desigualdades que existem entre os distritos. Uma vez que estes são estabelecidos por equivalentes populacionais, áreas com menor densidade populacional abrangerão uma diversidade muito maior de grupos com pautas e interesses distintos.

Isto é, um distrito paulista densamente povoado tem interesses muito mais uniformes do que um distrito do Amazonas que abrange um território muito maior e grupos com interesses conflitantes da população urbana, como indígenas e ribeirinhos. Por terem menor representação, estes grupos não vão ter força para eleger candidatos e seus votos não vão ser considerados para uma possível eleição pelo quociente, como no sistema proporcional.

Uma outra questão que pode ser explorada pelas casas de oposição é que a maior proximidade entre candidato e eleitor pode incentivar a formação de “currais eleitorais”, em que uma elite regional passa a dominar o cenário político, seja por ter muita influência naquela região, seja pela promessa de favores pessoais em troca de votos, as quais são amenizadas no sistema proporcional pela necessidade de um bom desempenho do partido para eleger candidatos.

Por fim, as casas de Oposição podem aproveitar o argumento da governabilidade. A eleição de candidatos por distrito leva à formação de um parlamento muito diverso e plural. Embora as casas de Governo possam argumentar que isso traz maior representatividade e diminui o lobby político dos partidos, esse cenário pode prejudicar a discussão de pautas de caráter nacional e a formação de acordos comuns no sistema proporcional.

Nessa perspectiva, os partidos têm um papel fundamental para a governabilidade por uniformizar o posicionamento de seus parlamentares em temas complexos, bem como por sua representatividade ideológica. Ou seja, os partidos, os quais possuem maior poder no sistema proporcional, representam ideias, e não um local específico, e podem, por conseguinte, defender pautas de grupos minoritários que ficariam invisibilizadas em um sistema de votação majoritário como o de voto distrital.

No entanto, as casas de Oposição ainda têm de lidar com os problemas do status quo, como o desinteresse popular na política, impulsionado pela candidatura de parlamentares que não foram escolhidos diretamente pelo povo, mas que se elegem pelo quociente, e os lobbies políticos, em que os partidos passam a defender interesses de grupos de influência que os favorecem e se afastam das pautas da população que o elegeu.

Como se vê, a questão central do debate gira em torno da representatividade e do engajamento popular no processo eleitoral. Enquanto as casas de Governo devem provar que o sistema distrital promove um avanço nessas questões, as casas de Oposição devem provar que a adoção desse modelo leva a um cenário pior do que o status quo.

Mas e você, qual lado defenderia desse debate?

[*] Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília, graduanda em Ciências Econômicas na UCB, Coordenadora de Módulos na Sociedade de Debates Hermenêutica e apaixonada por temáticas de Migração, Segurança Internacional e Defesa.

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