O segundo pedido de Recuperação Judicial e suas consequências

Caso Oi

por Falência e Recuperação em Foco

Escrito por Aline Cosme Neves Miranda de Aquino [*] e Eduardo Augusto Ramalho Duarte [**]

A aprovação recente do segundo pedido de recuperação judicial pela Oi lançou luz sobre questões cruciais quanto às implicações e aos requisitos envolvidos nesse processo excepcional para empresas. Após passar pelo primeiro processo entre 2016 e 2022, a companhia brasileira enfrenta novamente um cenário de dívidas significativas, totalizando R$ 43,7 bilhões (quarenta e três bilhões e setecentos milhões).[1] [2]

O plano de recuperação aprovado prevê a reestruturação das dívidas, que inclui a emissão de uma nova dívida de R$ 6,75 bilhões (seis bilhões e setecentos e cinco milhões) dividida em duas tranches. Parte dessa nova dívida será utilizada para rolar a dívida atual, com prioridade de pagamento aos credores que concordarem com as novas condições.[3]

Além disso, o plano inclui a venda de ativos e participação na V.tal, uma empresa controlada pelo BTG Pactual, que desempenhará um papel crucial na recuperação da Oi. A V.tal se comprometeu a injetar até US$ 150 (cento e cinquenta) milhões na Oi, contribuindo para a viabilidade do plano.[4]

A Oi também conseguiu acordos significativos com seus credores, incluindo fornecedores e credores internacionais, que aprovaram um aporte de US$ 500 (quinhentos) milhões. A expectativa é que essas medidas ajudem a empresa a enfrentar suas necessidades de liquidez no curto prazo e a reorganizar suas operações focando principalmente na banda larga e serviços corporativos.[5] [6]

No entanto, pedir recuperação judicial pela segunda vez traz implicações significativas para a empresa e para seus credores, além de requerer a observância de requisitos específicos. Alguns desses aspectos que valem o destaque são:

Credibilidade Abalada: a recorrência na recuperação judicial pode abalar a credibilidade da empresa junto aos credores, investidores e mercado em geral. Pode ser interpretado como uma incapacidade da empresa de se reestruturar eficazmente.

Condições Mais Rígidas: os credores podem impor condições mais rigorosas para aprovar um novo plano de recuperação, haja vista o insucesso do primeiro plano.

Deságio sobre deságio: os credores concursais, diante da novação que a recuperação judicial causa nos créditos (as dívidas que um dia existiram são substituídas por nova dívida, com novas obrigações atreladas, ao serem negociadas na 1ª recuperação judicial), se deparam com novo deságio sobre a dívida já negociada uma vez, o que prejudica a segurança jurídica do crédito e, evidentemente, impacta o custo Brasil.[7]

Chance aumentada de conversão em Falência: Apesar de não haver dados disponíveis sobre o tema (por serem pouquíssimos os casos de 2ª RJ), tendo em vista a maior criticidade dos credores diante do novo plano de recuperação judicial, suas chances de aprovação são evidentemente menores. Caso não seja aprovado, ou se a empresa não conseguir cumpri-lo, a consequência é a conversão do processo em falência. Já muito comum na primeira RJ[8], na segunda as chances tendem a ser ainda maiores.

Como já abordado, a 2ª Recuperação Judicial tem requisitos específicos, dentre eles:

  1. Intervalo de Tempo: a legislação brasileira exige um intervalo mínimo de 5 anos entre a concessão de uma recuperação judicial e o pedido de uma nova recuperação judicial pela mesma empresa.
  2. Prova de Cumprimento do Primeiro Plano: a Oi deve demonstrar que cumpriu integralmente as obrigações previstas no primeiro plano de recuperação judicial, antes de iniciar o novo processo.

Como já foi também introduzido acima, há diferenças significativas entre a Primeira e a Segunda Recuperação Judicial, quais sejam:

  1. Expectativas e Padrões: na segunda recuperação, há uma expectativa maior dos credores de que a empresa demonstre mudanças estruturais mais robustas e soluções mais concretas para os problemas financeiros, uma vez que o primeiro plano não foi suficiente. A recorrência no processo de recuperação judicial abala a credibilidade da recuperanda perante credores, investidores e o mercado em geral. Esta repetição pode ser vista como um sinal de dificuldades persistentes na reestruturação financeira da empresa, o que pode ser inclusive interpretado como irrecuperabilidade. Se o novo plano de recuperação não obtiver aprovação ou não for integralmente cumprido, há opera-se a conversão do processo em falência, o que eventualmente leva ao encerramento de atividades e fim da empresa.
  2. Análise Rigorosa do Plano: o segundo plano de recuperação será analisado com maior rigor pelos credores e pelo judiciário. Há um foco mais intenso em medidas de reestruturação e garantias de cumprimento, considerando o histórico anterior de não cumprimento completo do plano anterior.
  3. Reestruturação Profunda: espera-se que a Oi implemente uma reestruturação mais profunda da empresa, incluindo possíveis mudanças na gestão, alienação de ativos não essenciais e renegociação de dívidas em condições mais severas.

A Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei nº 11.101/2005) regula o processo de recuperação judicial e prevê as condições para pedidos subsequentes. Segundo a lei, a empresa deve observar um intervalo mínimo de 5 anos entre as recuperações. Havia, quando foi ajuizado o 2º pedido de recuperação judicial da Oi, alguma controvérsia sobre o termo do prazo a ser observado. Enquanto alguns defendiam que deveria ser contado a partir do último aditivo, a maioria defendia que o termo inicial era a homologação do 1º Plano de Recuperação Judicial, que foi o entendimento que prevaleceu.

Apesar do exposto, a Oi pediu a recuperação judicial alguns dias antes de completos 5 anos da homologação de seu PRJ e, para contornar a situação, alegou a urgência da adoção da medida, e viu deferida a tutela de urgência requerida, para que tivesse início seu stay period.

O stay period é um período durante o qual os credores não podem tomar medidas legais contra uma empresa que entrou em processo de recuperação judicial. Ele visa proporcionar estabilidade e permitir que a empresa reorganize suas finanças sem interferências judiciais imediatas.

Por fim, cabe reiterar que a segunda recuperação judicial é uma medida extrema e indica que a empresa enfrenta dificuldades financeiras graves e persistentes. As consequências são potencialmente severas, com impactos na credibilidade e nas condições de operação. Além disso, o rigor na análise e aprovação do segundo plano de recuperação é significativamente maior, exigindo da empresa uma demonstração clara de viabilidade e comprometimento com mudanças estruturais.

 

[1] GOZZI, Rodrigo. Segunda recuperação judicial da Oi (OIBR3) finalmente sai do papel; entenda como a empresa pretende quitar suas dívidas. Seu Dinheiro, 29.5.2024. Disponível em: https://www.seudinheiro.com/2024/bolsa-dolar/oi-oibr3-segunda-recuperacao-judicial-justica-homologa-rsgp

[2] Oi, Press Releases. Oi chega a um consenso com os credores nos principais termos do Plano De Recuperação Judicial. 27.3.2024. Disponível em: https://Www.Oi.Com.Br/Sala-De-Imprensa/P/Oi-Chega-A-Um-Consenso-Com-Os-Credores-Nos-Principais-Termos-Do-Plano-De-Recuperacao-Judicial.Htm

[3]  POSSEBON, Samuel. Com apoio de 79% dos credores, Oi aprova Plano de Recuperação Judicial. Teletime Newsletter: Crise da Oi. 19.4.2024. Disponível em: https://teletime.com.br/19/04/2024/com-apoio-de-7987-dos-credores-oi-aprova-plano-de-recuperacao-judicial/

[4] Oi, Press Releases. Oi chega a um consenso com os credores nos principais termos do Plano De Recuperação Judicial. 27.3.2024. Disponível em: https://Www.Oi.Com.Br/Sala-De-Imprensa/P/Oi-Chega-A-Um-Consenso-Com-Os-Credores-Nos-Principais-Termos-Do-Plano-De-Recuperacao-Judicial.Htm

[5] POSSEBON, Samuel. Com apoio de 79% dos credores, Oi aprova Plano de Recuperação Judicial. Teletime Newsletter: Crise da Oi. 19.4.2024. Disponível em: https://teletime.com.br/19/04/2024/com-apoio-de-7987-dos-credores-oi-aprova-plano-de-recuperacao-judicial/

[6] JURADO, Mariana. O caso Oi e a “Recuperação judicial da recuperação judicial”. Migalhas de Peso, 10.2.2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/381360/o-caso-oi-e-a-recuperacao-judicial-da-recuperacao-judicial

[7] Segundo o relatório do Observatório da Insolvência, Fase 3: Falências no Estado de São Paulo, da Associação Brasileira de Jurimetria, publicado em 29.4.2022. Disponível em: https://abj.org.br/observatorios/obs_fal_sp/

 

[*] Estudante de Direito na Universidade de Brasília (UnB), e se interessa pelas áreas de direito contratual, obrigacional, de famílias e empresarial.

[**] Estudante de Direito na Universidade de Brasília (UnB), com interesse particular em direito internacional público e privado, direitos humanos, direito constitucional e políticas públicas.

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